16
Ago 11

Hoje é o dia

 

UNS, COM OS OLHOS postos no passado,
Vêem o que não vêem; outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se.

Por que tão longe ir pôr o que está perto –
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo.

Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele. 

(...)

 

Ricardo Reis

publicado por imprevistoseacasos às 18:27 | comentar | ver comentários (1) | favorito
22
Mai 11

A lúcida Adília Lopes...

 

Há coisas

sobre

as quais

me quero

calar

porque

preciosas

de mais

precisas

de mais

 

Outras

porque

cruas

de mais

como

aventais

 

Adília Lopes

publicado por imprevistoseacasos às 15:19 | comentar | favorito
20
Fev 11

Rendo-me às tisanas


306

Algo está sempre a acontecer. Por isso escrevo. Escrevo porque algo aconteceu ou acontece. Escrever é isso, mas escrever é sobretudo produzir o acontecer.
Ana Hatherly, in "463 Tisanas", Ed. Quimera
publicado por imprevistoseacasos às 19:14 | comentar | favorito
05
Jun 10

Ritmos

 

E descascar ervilhas ao ritmo de um verso:

a prosódia da mão, a ervilha dançando

em redondilha.

Misturar ritmos em teia apertada: um vira

bem marcado pelo jazz, pas

de deux: eu, ervilha e mais ninguém


De vez em quando o salto: disco sound

o vazio pós-moderno e sem sentido

Ah! hedónica ervilha tão sozinha

debaixo do fogão!


As irmãs recuperadas ainda em anos 20

o prazer da partilha: cebola, azeite

blues desconcertantes, metamorfose em

refogados rítmicos


(Debaixo do fogão

só o silêncio frio)

ANA LUÍSA AMARAL, Minha Senhora de Quê

 


publicado por imprevistoseacasos às 15:09 | comentar | favorito
tags:
08
Abr 10

Seguir o trilho de Adília Lopes

 

Mesmo
uma linha
recta
é o labirinto
porque
entre
cada dois pontos
está o infinito

 

[in Caderno, & Etc, 2007]

publicado por imprevistoseacasos às 16:44 | comentar | favorito
tags:
09
Jan 10

Poema em Cinema

 

 

Estrela Cintilante
Título original: Bright Star
De: Jane Campion
Com: Paul Schneider, Thomas Sangster, Abbie Cornish, Kerry Fox

 

Em 1818, o jovem poeta inglês John Keats (Ben Whishaw) apaixona-se pela sua vizinha Fanny Brawne (Abbie Cornish) sem imaginar como isso irá mudar a sua vida. Apesar de terem muito pouco em comum, - ele um poeta romântico, ela uma estudante de moda pouco dada à literatura - a grave doença do irmão mais novo de John aproxima-os. Essa amizade, que rapidamente se transforma num amor sem limites, tendo a poesia como linguagem, acaba por tornar-se uma obsessão difícil de aceitar por todos os que os rodeiam. Mas, apesar de todas as contrariedades, só a doença e morte prematura de John Keats terá o poder de os separar.
Um filme biográfico, realizado por Jane Campion, cujo título original se inspira em Bright Star: Love Letters and Poems of John Keats to Fanny Brawne, uma colectânea de cartas de amor e poemas do próprio escritor dedicados ao amor da sua vida.

 

PÚBLICO 

 

publicado por imprevistoseacasos às 16:19 | comentar | favorito
tags: ,
31
Dez 09

Esperança no novo ano

Esperança:
isto de sonhar bom para diante
eu fi-lo perfeitamente,
Para diante de tudo foi bom
bom de verdade
bem feito de sonho
podia segui-lo como realidade

 

Esperança:
isto de sonhar bom para diante
eu sei-o de cor.
Até reparo que tenho só esperança
nada mais do que esperança
pura esperança
esperança verdadeira
que engana
e promete
e só promete.


Esperança:
pobre mãe louca
que quer pôr o filho morto de pé?

Esperança
único que eu tenho
não me deixes sem nada
promete
engana
engano que seja
engana
não me deixes sozinho
esperança.

 

Almada Negreiros

 

publicado por imprevistoseacasos às 11:19 | comentar | ver comentários (4) | favorito
tags:
13
Out 09

Florbela Espanca, Saudades

 

 

 

Saudades! Sim... Talvez... e porque não?...
Se o nosso sonho foi tão alto e forte
Que bem pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

 

Esquecer! Para quê?... Ah! como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como o pão!

 

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar,
Mais doidamente me lembrar de ti!

 

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais a saudade andasse presa a mim!

 

 

Florbela Espanca

 

publicado por imprevistoseacasos às 20:10 | comentar | ver comentários (3) | favorito
tags:
18
Ago 09

Confiança


O que é bonito neste mundo, e anima,
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar outra aventura...
E que a doçura
Que se não prova
Se transfigura
Numa doçura
Muito mais pura
E muito mais nova...

                Miguel Torga

 

publicado por imprevistoseacasos às 23:36 | comentar | favorito
tags:
31
Mai 09

Walt Whitman

 

Vida

 

Sempre a indesencorajada alma do homem
resoluta indo à luta.
(Os contingentes anteriores falharam?
Pois mandaremos novos contingentes
e outros mais novos.)
Sempre o cerrado mistério
de todas as idades deste mundo
antigas ou recentes;
sempre os ávidos olhos, hurras, palmas
de boas-vindas, o ruidoso aplauso;
sempre a alma insatisfeita,
curiosa e por fim não convencida,
lutando hoje como sempre,
batalhando como sempre.

Walt Whitman, in "Leaves of Grass
"

publicado por imprevistoseacasos às 11:42 | comentar | ver comentários (4) | favorito
tags: