Sem alarido
Entrou em casa, devagar, empurrada pelas malas e pelas ordens do marido. Era o "pega nisto", "então as chaves?", "onde está a tua cabeça" e "é para hoje?" Não dizia nada, apenas se concentrava na árdua tarefa de agradar, de corresponder.
Tinham voltado de uma semana de férias, no Algarve. Ela tinha uma casa de família, fechada há anos e, finalmente, passados mais de vinte anos fechada em sua casa, resolveu dizer que queria lá ir. Até sozinha conseguiria ir. O marido primeiro escarneceu e depois, percebendo a determinação, acabou por concordar. Pena tamanha despesa, em plena crise.
Foram silenciosos, cedo, naquela manhã. Voltaram à noite, trazendo a brisa desagradável que sempre os acompanhou: o desencanto.