"Enquanto subia os degraus da escadaria, Madalena fazia trejeitos com o rosto e bramia os braços, como quem discute solitariamente, com ardor, com impaciência. Parou a meio e olhou mais uma vez para o rosto enigmático do quadro - ninguém lhe soubera explicar de quem era aquele rosto branco esverdeado, com uns grandes olhos pretos adornados por laivos vermelhos. Os lábios eram igualmente escuros, pequenos e bem delineados. Na verdade, o rosto parecia-lhe uma pêra rocha exangue, sem pestanas, sem protecção, sem vida. Há muito tempo que aquele rosto mascarado a perturbava. Interrompia-lhe os pensamentos e parecia segui-la por toda a casa. Ensaiou aquele olhar inexpressivo enquanto cumprimentava alguns conhecidos. Divertiu-se ao pensar em como seria se aparecesse ao trabalho com o cabelo apanhado e com um rosto branco e lábios negros, sem qualquer sombra de vida. Fez uma careta enquanto estes pensamentos a entretinham."
FSC
"Brincava com as mãos, enquanto esperava que saíssem do quarto. Sempre preferira a mão esquerda, mais marcada pela escrita, pela vida, pelos esfregões de aço. Lá dentro ouvia-se uma discussão quase muda, e ali, perto do elevador de serviço, Madalena já via imagens ficcionadas do que seria o drama de outros, partilhado com ela."