16
Ago 11

Hoje é o dia

 

UNS, COM OS OLHOS postos no passado,
Vêem o que não vêem; outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se.

Por que tão longe ir pôr o que está perto –
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo.

Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele. 

(...)

 

Ricardo Reis

publicado por imprevistoseacasos às 18:27 | comentar | ver comentários (1) | favorito
22
Mai 11

A lúcida Adília Lopes...

 

Há coisas

sobre

as quais

me quero

calar

porque

preciosas

de mais

precisas

de mais

 

Outras

porque

cruas

de mais

como

aventais

 

Adília Lopes

publicado por imprevistoseacasos às 15:19 | comentar | favorito
20
Fev 11

Rendo-me às tisanas


306

Algo está sempre a acontecer. Por isso escrevo. Escrevo porque algo aconteceu ou acontece. Escrever é isso, mas escrever é sobretudo produzir o acontecer.
Ana Hatherly, in "463 Tisanas", Ed. Quimera
publicado por imprevistoseacasos às 19:14 | comentar | favorito
25
Mai 09

Lugares comuns

 

Entrei em Londres

num café manhoso (não é só entre nós

que há cafés manhosos, os ingleses também,

e eles até tiveram mais coisas, agora

é só a Escócia e parte da Irlanda e aquelas

ilhotazitas, mais adiante)

 

 

Entrei em Londres

num café manhoso, pior ainda que um nosso bar

de praia (isto é só para quem não sabe

fazer uma pequena ideia do que eles por lá têm), era

mesmo muito manhoso,

não é que fosse mal intencionado, era manhoso

na nossa gíria, muito cheio de tapumes e de cozinha

suja. Muito rasca.

 

Claro que os meus preconceitos todos

de mulher me vieram ao de cima, porque o café

só tinha homens a comer bacon e ovos e tomate

(se fosse em Portugal era sandes de queijo),

mas pensei: Estou em Londres, estou

sozinha, quero lá saber dos homens, os ingleses

até nem se metem como os nossos,

e por aí fora...

 

E lá entrei no café manhoso, de árvore

de plástico ao canto.

Foi só depois de entrar que vi uma mulher

sentada a ler uma coisa qualquer. E senti-me

mais forte, não sei porquê, mas senti-me mais forte.

Era uma tribo de vinte e três homens e ela sozinha e

depois eu

 

Lá pedi o café, que não era nada mau

para café manhoso como aquele e o homem

que me serviu disse: There you are, love.

Apeteceu-me responder: I’m not your bloody love ou

Go to hell ou qualquer coisa assim, mas depois

pensei: Já lhes está tão entranhado

nas culturas e a intenção não era má, e também

vou-me embora daqui a pouco, tenho avião

quero lá saber

 

E paguei o café, que não era nada mau,

e fiquei um bocado assim a olhar à minha volta

a ver a tribo toda a comer ovos e presunto

e depois vi as horas e pensei que o táxi

estava a chegar e eu tinha que sair.

E quando me ia levantar, a mulher sorriu

Como quem diz: That’s it

 

e olhou assim à sua volta para o presunto

e os ovos e os homens todos a comer

e eu senti-me mais forte, não sei porquê,

mas senti-me mais forte

e pensei que afinal não interessa Londres ou nós,

que em toda a parte

as mesmas coisas são

 

      Ana Luísa Amaral

publicado por imprevistoseacasos às 09:04 | comentar | ver comentários (2) | favorito
13
Mai 09

Mário Viegas, cantiga dos ais.

Lembrei-me deste "apontamento" do Mário Viegas para o estado de espírito de algum povo português...

Mas, muito pior do que isto, é não ter ninguém que oiça, não concordam?

 

 

publicado por imprevistoseacasos às 22:13 | comentar | ver comentários (2) | favorito
06
Nov 08

Arma secreta

 


Tenho uma arma secreta
ao serviço das nações.
Não tem carga nem espoleta
mas dipara em linha recta
mais longe que os foguetões.

Não é Júpiter, nem Thor,
nem Snark ou outros que tais.
É coisa muito melhor
que todo o vasto teor
dos Cabos Canaverais.

A potência destinada
às rotações da turbina
não vem da nafta queimada,
nem é de água oxigenada
nem de ergóis de furalina.

Erecta, na noite erguida,
em alerta permanente,
espera o sinal da partida.
Podia chamar-se VIDA.
Chama-se AMOR, simplesmente.


António Gedeão, Poesias Completas
 

 

publicado por imprevistoseacasos às 18:57 | comentar | ver comentários (1) | favorito
26
Set 08

Comunidade

Comunidade de Leitores
Linguagem Literária e Linguagem Pictórica. Por Helena Vasconcelos

 

 Foi um prazer o primeiro dia de conversa em torno de Dorian Gray. Helena Vasconcelos foi, como sempre, uma notável animadora destas tertúlias. Os convivas de todas as idades e de gostos tão diversos, tiveram a oportunidade de falar, interpretar, relacionar diferentes obras com o universo de Oscar Wilde. Aguardo com entusiasmo a segunda conversa na certeza de que muito se poderá ganhar nesta comunidade moderna, uma revisitação das antigas tertúlias que tanto fizeram pela nossa literatura.

 

Deixo aqui as palavras de Helena Vasconcelos: 

"Toda a Arte é imoral", como disse Oscar Wilde? Ou será uma "amante ciumenta" como afirmou Ralph Waldo Emerson? Exigirá a "supressão do eu" como escreveu melancolicamente Henry James? Ou fará desaparecer tudo o que é desagradável, por estabelecer "a relação perfeita entre a verdade e a beleza", na opinião optimista do poeta John Keats?
Uma vez que escrever é uma Arte e que outras artes são atravessadas pela Literatura, o que acontecerá com esta auspiciosa fusão?
Ao longo da leitura destas obras tentaremos descobrir a forma como, tanto através da escrita como através da pintura ou do desenho, os artistas nos "contam histórias", oferecendo pistas, enigmas e ilusão, à medida que se desvendam a si próprios e nos facultam a chave para a compreensão da sua arte e do seu tempo.
Com Wilde exploraremos o poder da representação narcísica (Dorian Gray passou a ser nome de síndrome) e com Joyce a mestria de um exercício de auto-‑conhecimento. Com Agustina, Frayan e Chevalier exploraremos a época de ouro da pintura flamenga dos séculos XVI e XVII. Breugel e o seu dramático tempo, quando os Países Baixos lutavam contra a coroa espanhola, é o centro do delirante livro de Frayan, enquanto Rembrandt é o de Agustina e Vermeer o de Tracy Chevalier. Quanto à obra de Byatt, embora trate essencialmente da articulação da poesia vitoriana, está indissoluvelmente ligada ao movimento pré-rafaelita de (entre outros) Dante Gabriel Rossetti.
As "pontes" – mas também as cisões – entre a linguagem literária e a linguagem pictórica serão o pretexto para as nossas leituras".
 

publicado por imprevistoseacasos às 16:14 | comentar | favorito
20
Set 08

Valter Hugo Mãe

Hoje na FNAC Colombo, Valter Hugo lança o seu livro "O apocalipse dos trabalhadores".  Só para o ouvir, valerá a pena ir até lá. Escreve, pinta, aparentemente canta para os amigos. Muito interessante. Mesmo Saramago assim o considera. Valter Hugo ganhou o Prémio Saramago em 2007. Hoje é dia de Valter Hugo Mãe.

 

 

publicado por imprevistoseacasos às 10:22 | comentar | favorito
03
Set 08

Uma Tisana

 

87

"Era uma vez uma paisagem onde nunca havia nuvens. Para chover era preciso lavar o horizonte com penas".

 

                                                                    Ana Hatherly

publicado por imprevistoseacasos às 11:09 | comentar | favorito
30
Ago 08

O português

 

"O português não é conflituoso, é desordeiro.

O conflito está na mente; a desordem está no coração."

 

 

                                                               Agustina Bessa-Luís

publicado por imprevistoseacasos às 15:30 | comentar | favorito
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